Nós, que estamos na FEA, por vós esperamos
Governar por decretos é prática autoritária e truculenta. Mesmo convictos de que a própria democracia representativa é insuficiente para garantir o cumprimento das vontades da população, nós, membros do ALFA-USP, nos posicionamos não apenas contra o conteúdo dos decretos do governo Serra, mas contra o significado político desse modo de governar.
Como integrantes de um grupo de educação popular de jovens e adultos que atua em favor de um sistema educacional verdadeiramente público, universal e gratuito, também não aceitamos a tentativa do governo estadual de interferir na autonomia (que nunca foi plena e precisa ser aprofundada) das universidades paulistas. Compreendendo esse contexto, o ALFA-USP apóia a greve dos estudantes, professores e funcionários da Universidade de São Paulo.
Acreditamos, porém, que a greve, em si, não se faz enquanto instrumento de pressão, mas permite um espaço de reflexões sobre os caminhos da universidade pública, e sobre as maneiras possíveis de se lutar por aquilo que acreditamos.
A quebra da normalidade, do dia-a-dia de aulas, garante ao estudante um espaço em que o assunto universidade pública, junto com outras tantas bandeiras de luta, seja colocado em discussão. A greve, não com um fim em si mesma, viabiliza um momento em que paramos e pensamos sobre os nossos papéis enquanto estudantes, sujeitos de nossa História; e faz surgir, também, um período em que se torna possível nossa atuação direta na luta pela educação pública, universal, gratuita e de qualidade no país.
Ao contrário de greves operárias, a greve estudantil não tem como objetivo pressionar o governo por meio da paralisação da máquina de ensino, até porque – acreditamos – isso pouco afeta a burocracia do Estado, e aparece de maneira negativa para a opinião pública. A greve estudantil, então, se pretende como um período em que estudantes, ao lado de professores e funcionários, interrompem suas atividades cotidianas para pensarem e executarem, juntos, maneiras possíveis de se pressionar o governo, e conseguirem as transformações desejadas, contra o sucateamento do ensino superior público.
Para isso, acreditamos que a greve não deve ser vista de forma simplista, como apenas um tempo de não-aula, em que passamos nossos dias longe da universidade. O espaço e o tempo possibilitados pela greve deve ser um espaço criativo, rico em discussões, atividades, mobilizações, ações. É um precioso espaço de formação política dos estudantes da universidade.
Concordamos, sim, que a greve não é a mais perfeita forma de mobilização, até porque em muitos institutos ela se dá de forma desagregadora e pouco construtiva. Está bastante claro, também, que boa parte dos alunos da USP são bastante refratários à palavra greve, por ela vir cercada de estigmas e preconceitos (muitos deles que não se sustentam, e são carregados de uma ideologia anti-movimento- estudantil) . Por isso, acreditamos, greves não devem ser decretadas ou impostas, mas sim construídas, de forma agregadora e não autoritária.
Nós, enquanto membros de um coletivo auto-gestioná rio da USP, acreditamos na legitimidade dos espaços de decisão colocados a cabo pelos estudantes, e reconhecemos a importância de se referendar a greve para se pautar as discussões nos cursos, nas entidades de base, nas salas de aula. Mesmo com os prejuízos acadêmicos, ainda acreditamos na riqueza de possibilidades trazida pela greve estudantil.
Esperamos que essa prática seja superada, com idéias criativas ou novas propostas; mas para a sua própria superação, um espaço para "se parar, pensar e agir" é também necessário – e este espaço dificilmente nascerá da normalidade.
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