bonne appetit!
Texto do prof Antonio Miguel (FE-UNICAMP) em resposta ao prof Giannotti
bonne appetit!
Texto do prof Antonio Miguel (FE-UNICAMP) em resposta ao prof Giannotti
O "Rocha Lima" pensa que a natureza do trabalho social que existe na Universidade é a produção intelectual. Para esta existir é necessário que exista compreenssão entre os produtores deste tipo de conhecimento, ou seja, docentes, discentes e funcionários. Entendemos por compreenssão a capacidade de um indivíduo defender um dado ponto de vista mesmo que contrário a ele. Para que a compreenssão seja possível, pensamos que três pontos devem ser respeitados:
-Rigor: É ter clareza do que se sabe, do que não se sabe, do porquê não se sabe. Esta clarificação permite traçar estratégias na busca daquilo que não se sabe.
-Recusa da autoridade: As ações devem ser construídas nas instâncias coletivas, repeitando-se suas deliberações. Somente com amplo debate constituído por diferentes visões de mundo pode-se construir hipóteses abstratas que mais se aproximem da realidade concreta.
-Emancipação: Seria a tentativa de expressar uma realidade compreensível, através da clarificação de experiências e da crítica ao senso comum.
Ao respeito destes três princípios damos o nome de AUTONOMIA. E quando um destes princípios são apropriados, tem-se a aparelhação ideológica da Universidade, impedindo-se a produção de conhecimento científico. Entendemos que na atual conjuntura, um grave ataque à autonomia ocorre nas Universidades Públicas Estaduais de SP, através dos Decretos do Governo José Serra (PSDB).
Eles refltem uma visão fragmentada e equivocada de Educação e de Produção Científica, dividindo a responsabilidade pelos níveis de ensino em diferentes Secretarias. Um exemplo claro desta situação é a reorganização da Secretaria de Ciência e Tecnologia em Secretaria do Desenvolvimento, vinculando a esta a CEETPS e a FAPESP. Fala-se ali em "promover ações voltadas para o desenvolvimento, qualificação e expansão do ensino profissional em todos os seus níveis, bem como a pesquisa científica e tecnológica, sob a ótica do desenvolvimento econômico sustentável e dainclusão social". Ao se ignorar que o CEETPS promove ensino superior, e ao realocá-lo para uma secretaria com os propósitos acima citados, pensa-se numa formação restrita ao adestramento profissional, voltada pura e simplesmente para a lógica de mercado. A expansão do Ensino Público se dará para manter e não questionar o status quo vigente. Ao se realocar a FAPESP para a Secretaria de Desenvolvimento, e criar a Secretaria de Ensino Superior, vinculando a esta as Universidades Públicas Estaduais e atribuindo-lhe como campo funcional a pesquisa operacional, pensa-se na omissão da pesquisa básica e da pesquisa aplicada. Ciência operacional é criação de adaptação tecnológica. Basta observarmos os dois últimos convênios para o desenvolvimento de "pesquisa" que a FAPESP assinou com as empresas Telefônica e Microsoft, cedendo metade do valor inicial de
investimento em ambos projetos. Será que a empresa de Bill Gates necessita de nosso dinheiro público para criar adaptação tecnológica? Será que sobrará dinheiro para a necessária expansão das bolsas de iniciação científica? Será que projetos de pesquisa básica terão financiamento?
Outra questão preocupante é a distorção que a grande mídia faz do movimento contrário aos Decretos ao dizer que "somos contrários à transparência da Universidade frente à sociedade". Não somos contrários à prestação de contas, já que sabemos que há muitos anos as Universidades Públicas Estaduais enviam suas transações ao SIAFEM/SP. A questão que se coloca em pauta é o fato de que a verba destinada às Universidades passa a ficar alocada junto à Conta Única do Tesouro, gerida por órgãos executivos. A perda da autonomia financeira viculará as Universidades aos projetos
partidários dos Governos que se sucedem, tão presente em nossa História Republicana, em que não existe um projeto de Nação Soberana. A ocupação da Reitoria da USP sinaliza um ascenso no processo de mobização, que não deve se encerrar aqui. Temos a convicção de que este é um dos mais violentos ataques às Universidades Públicas. O posicionamento diante da conjuntura e a reflexão histórica são fundamentais. No campus de Ribeirão Preto da USP, os Centros Acadêmicos estão se articulando através de reuniões quinzenais, sugeridas pelo "Rocha Lima" em conjunto com o Centro Acadêmico da Filosfia. Lutamos e lutaremos conta os Decretos; por políticas Efetivas
de Permanência Estudantil; pela não punição e pela solução pacífica dos Ocupantes e da Ocupação, respectivamente; pela Democratização da Universidade. Afirmamos, por isso, que estamos prontos, como movimento estudantil, mais uma vez, para a Defesa da Uiversidade Pública, Gratutita e
de Qualidade.
Emerson Rafael Lopes
Vice Presidente do CARL
Durante as próximas semanas, vários professores do curso de Letras da FFLCH estarão ministrando palestras sobre diversos temas, na sala 107 do prédio, no intuito de evitar que a greve da faculdade resulte em defasagem acadêmica dos estudantes e que seja apenas uma manifestação vazia: queremos evitar a "greve de pijama" e a perda de tempo generalizada. Por isso, todos que quiserem comparecer e absorver o conhecimento que esses doutores estão dispostos a compartilhar serão bem-vindos. A semana entre os dias 28 e 3, assim como o período da manhã das semanas seguintes, contará com palestras concebidas principalmente para os alunos de graduação, embora sirvam bem a quaisquer interessados, enquanto os eventos noturnos das semanas entre os dias 4 e 17 serão mais voltados a alunos de cursinho, versando sobre os livros cobrados pelo vestibular. Segue o calendário já definido:
Dia 29/5, terça-feira: 10h- Baudelaire, por Viviana Bosi
19h- "O Direito à Literatura", por Roberto Zular
Dia 30/5, quarta-feira: 10h- Formação do romance inglês, por Sandra Vasconcellos
Dia 31/5, quinta-feira: 10h- Poesia e participação, por Ivone Daré Rabello
19h- [tema a definir], João Adolfo Hansen
Dia 1/6, sexta-feira: 10h- Violência e melancolia, por Jaime Ginzburg
Dia 4/6, segunda-feira: 19h- "Dom Casmurro", por Luiz Roncari
Dia 5/6, terça-feira: 19h- "O Auto da Barca do Inferno", por Flávia Corradin e Francisco Maciel Silveira
Dia 6/6, quarta-feira: 10h- Cervantes, por Maria Augusta da Costa Vieira
19h- "A Cidade e as Serras", por Helder Garmes
Dia 11/6, segunda-feira: 10h- Oswald de Andrade, por Maria Augusta Fonseca
19h- "Poemas Completos de Alberto Caeiro", por Adma Fadul Muhana
Dia 12/6, terça-feira: 10h- Teatro político no Brasil, por Cláudia de Arruda Campos
19h- "Iracema", por Eduardo Vieira Martins
Dia 13/6, quarta-feira: 19h- "Vidas Secas", por José Miguel Wisnik
Dia 14/6, quinta-feira: 19h- "Sagarana", por Yudith Rosembaum
Dia 15/6, sexta-feira: 19h- "Memórias de um Sargento de Milícias", por Cilaine Alves da Cunha
Além dos já confirmados, esperam programação final um evento sobre poesia contemporânea na noite do dia 30/5, uma apresentação musical do professor Wisnik na noite do dia 1/6, a palestra sobre "A Rosa do Povo" e outras que preencham os horários livres, posivelmente até o fim do período de greves.Na segunda-feira, dia 28/05, não haverá programação para que todos os estudantes possam comarecer à sua Assembléia, a ser realizada às 18h em frente à Reitoria, com o objetivo de prosseguir com o processo democrático de reivindicações. Esperamos que todos aproveitem essa oportunidade para participar da greve e fazer dela um movimento consciente e produtivo.
Gratos pela atenção
Comissão de Contato com Professores e Comissão de Comunicação da greve da Letras
AUTONOMIA AGREDIDA
Dalmo de Abreu Dallari
O novo Governador do Estado de São Paulo, José Serra, iniciando o exercício de seu mandato no começo de 2007, editou um conjunto de decretos que parecem ter sido preparados de afogadilho e sem avaliação de suas conseqüências, tendo já acarretado algumas conseqüências negativas, estando neles a raiz da invasão da Reitoria da Universidade de São Paulo por estudantes daquela universidade. Seja qual for a opinião quanto à conveniência e oportunidade da invasão, o fato é que os decretos do Governador estão diretamente ligados àquele acontecimento. Talvez se diga que se os estudantes estivessem mais bem informados quanto ao exato conteúdo dos decretos e ao seu alcance poderiam manifestar desacordo, mas sem chegar àquela medida drástica, mas isso também revela a afoiteza e imprudência do governo na apresentação do fato consumado, sem maiores esclarecimentos. Na realidade, a análise jurídica dos referidos decretos leva à conclusão de que existem ali algumas evidentes inconstitucionalidades, havendo mesmo, em alguns pontos, uma tentativa de mascarar a realidade, por meio de uma espécie de ilusionismo jurídico, que, no entanto, não resiste a um exame mais atento, mesmo que baseado apenas no bom senso e na lógica. Bastaria observar que no dia 1º de janeiro de 2007 o novo Governador já emitiu extensos decretos, eliminando e criando Secretarias na organização administrativa superior do Estado, para tanto exercendo atribuições que não são do Executivo, mas da Assembléia Legislativa do Estado. É oportuno lembrar que o decreto é ato administrativo, que o Chefe do Executivo pode praticar para fixar regras de caráter regulamentar, mas que só têm validade e força jurídica se não contrariarem qualquer dispositivo da Constituição ou de alguma lei. E isso não foi observado.
Um desses decretos, o de número 51.460, de 1º de janeiro de 2007, pode ser considerado extremamente audacioso, pois expressa uma tentativa de alterar pontos substanciais da ordem pública pública, criando e extinguindo órgãos de grande relevância na organização administrativa fundamental do Estado, fingindo que só estão sendo mudados os nomes de alguns desses órgãos, sem nenhuma consideração pelos objetivos que inspiraram a criação desses órgãos e pelas características de suas organização, bem como pela especialização de seus quadros. A par desse absurdo, ocorrem ainda agressões a normas constitucionais expressas e já tradicionais no sistema constitucional brasileiro, como as que consagram a autonomia das Universidades públicas. A mais absurda dessas investidas contra a Constituição e o bom senso é a que consta do artigo 1º, inciso III, desse decreto, cuja redação é mais do que eloqüente na denúncia do absurdo:
“Artigo 1º. A denominação das Secretarias de Estado a seguir relacionadas fica alterada na seguinte conformidade:
………………………………………………………………………………………………………………
III. de Secretaria de Turismo para Secretaria de Ensino Superior.”
Essa pretensa mudança de nome é uma aberração mais do que óbvia, pois o nome identifica toda uma estrutura, criada para atingir objetivos determinados e organizada para atingir essa finalidade. É do mais elementar bom senso que tendo sido criada para fomentar o turismo aquela Secretaria foi organizada de modo a poder atuar na área do turismo, com órgãos adaptados às características dessa área e, obviamente, com um funcionalismo especializado nesse setor de atividades. Se o Governador alegar que vai aproveitar a mesma organização e os mesmos funcionários estará afirmando um absurdo, pois ninguém será tão tolo a ponto de admitir que o mesmo dispositivo criado para atuar no turismo será competente e eficiente para desempenhar atividades de apoio e fomento à Educação Superior. E se disser que haverá completa alteração da estrutura organizacional e substituição do funcionalismo por outro capacitado para agir na área da Educação Superior, criando-se os cargos indispensáveis para tanto, estará confessando a fraude, a extinção de uma Secretaria e a criação de outra sob o simulacro de mudança de nome. Isso, além de tudo, configura uma inconstitucionalidade em face da Constituição do Estado de São Paulo.
Na realidade, a Constituição paulista dispõe, no artigo 24, parágrafo 2º, que “compete exclusivamente ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:…2) criação e extinção de Secretarias de Estado e órgãos da administração pública, observado o disposto no artigo 47, XIX”. Segundo este último dispositivo, enxertado na Constituição do Estado pela Emenda Constitucional nº 21, de 2006, o Governador poderá dispor, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos. Ora, para que a Secretaria de Educação Superior possa agir com a mínima eficiência no âmbito da Educação é indispensável a existência de órgãos e servidores adequados e capacitados para esse objetivo, o que, evidentemente, não foi feito quando se criou a Secretaria de Turismo. A prova disso é que por meio de outro decreto, o de número 51461, também de 1º de Janeiro de 2007, o Governador do Estado definiu a organização da Secretaria de Educação Superior, ali incluindo muitos órgãos que, por motivos óbvios, não existiam nem existem na Secretaria de Turismo.
Em sentido oposto à necessidade de criação de órgãos e de cargos para especialistas em educação, é evidente que muitos órgãos, ligados ao turismo, ficarão inúteis, por absoluta inadequação, com a simulação da simples mudança de objetivos, impondo-se a extinção de tais órgãos, pela exigência óbvia de eliminação de despesas inúteis. Acrescente-se que com a simulação de simples mudança de nome da Secretaria, tentando ocultar a extinção de uma e a criação de outra, o Governador ofendeu a Constituição do Estado de São Paulo. De fato, pelo artigo 19, inciso VI, da Constituição, compete à Assembléia Legislação, com a sanção do Governador do Estado, dispor sobre a criação e extinção de Secretarias do Estado. Ou seja, esses atos exigem a aprovação de uma lei pela Assembléia Legislativa, não podendo ser praticados por decreto.
Outro ponto fundamental, relacionado com os decretos pelo atual Governador do Estado, é a ofensa à autonomia das Universidades Públicas, que tem apoio na Constituição da República e já constitui uma tradição no sistema público de educação superior no Brasil. Para que isso fique evidente, é oportuno lembrar o que dispõe a Constituição brasileira de 1988 sobre a autonomia das Universidades:
“Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.” Autonomia é expressão de origem grega, que indica o direito de agir independentemente, com suas próprias leis, tendo-se consagrado na linguagem política, jurídica e administrativa brasileira como sinônimo de auto-governo e auto-determinação. A autonomia das universidades foi uma conquista que atravessou várias etapas, incluindo a luta pela libertação de limitações à busca de conhecimentos e à afirmação de novas verdades científicas impostas por motivos religiosos. Em séculos mais recentes, a luta pela autonomia na busca e aquisição e transmissão de conhecimentos teve por meta a eliminação das limitações e dos condicionamentos impostos por motivos de conveniência política ou por intolerância e ignorância de governantes. Como parte da luta pela autonomia, colocou-se a exigência de apoio financeiro e de plena liberdade nas decisões sobre os objetivos e o modo de utilização dos recursos recebidos, para que prepondere sempre o interesse da humanidade, que deve ser o parâmetro superior da comunidade universitária.
Quanto ao sentido e à importância da autonomia, vem a propósito lembrar as observações feitas por dois notáveis juristas brasileiros que se detiveram no estudo do assunto e que com palavras claras e incisivas registraram suas conclusões. Um deles é Hely Lopes Meirelles, uma das mais importantes figuras do Direito Administrativo brasileiro, que, em estudo elaborado no ano de 1989, tendo em conta ameaças feitas à autonomia da Universidade Federal Fluminense, assim se expressou: “Na atual conjuntura, em face do artigo 207 da Constituição da República, “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. É a carta de alforria dessa instituições educacionais, que, ao longo do tempo, estiveram, muitas vezes, jungidas aos interesses eleitoreiros e imediatistas de quantos se arvoraram “tutores” da universidade.”
Outro notável mestre do Direito Público brasileiro, Caio Tácito, que foi professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em estudo publicado na Revista de Direito Administrativo, também no ano de 1989, discorreu, com clareza didática, sobre o significado e o alcance da autonomia universitária. Eis as palavras do mestre:
“A universidade deve nascer, viver e conviver sob o signo da autonomia, que é um conceito multilateral. Primordialmente, autonomia científico-pedagógica, porque é da essência da instituição universitária criar, pesquisar, ordenar e transmitir o conhecimento, como elemento fundamental para difundir a educação e fomentar a cultura. Essa missão básica da universidade pressupõe, no entanto, a disponibilidade de meios flexíveis e satisfatórios à plenitude da concreção de seus fins. Daí a necessidade de estender-se o princípio da autonomia aos meios de operação, consistentes na autonomia patrimonial, autonomia orçamentária e financeira, autonomia administrativa e autonomia disciplinar.”.
A Constituição do Estado de São Paulo reproduz a garantia de autonomia das universidades, coerente com o disposto na Constituição da República, adicionando alguns pontos que é oportuno conhecer. Dispõe a Constituição paulista, no artigo 154, que “a autonomia da universidade será exercida respeitando, nos termos do seu estatuto, a necessária democratização do ensino e a responsabilidade pública da instituição, observados os seguintes princípios: I. utilização dos recursos de forma a ampliar o atendimento da demanda social, tanto mediante cursos regulares quanto atividades de extensão; II. representação e participação de todos os segmentos da comunidade interna nos órgãos decisórios e na escolha dos dirigentes, na forma de seus estatutos.”
Um ponto muito evidente, é que pelo próprio conceito de autonomia, como foi consagrado no sistema Constitucional brasileiro, assim como pelas disposições expressas das Constituições da República e do Estado de São Paulo, cabe à Universidade, exclusivamente e sem qualquer interferência externa, definir suas prioridades e suas diretrizes. Isso implica, também, a competência exclusiva da universidade para definir suas atividades de estudo e pesquisa, sem nenhuma interferência, a qualquer título, de órgãos da administração pública estadual. Por esse ponto fica evidenciada a inconstitucionalidade do decreto estadual nº 51.461, de 1º de janeiro de 2007, que pretendeu dar à Secretaria de Ensino Superior uma série de atribuições que são exclusivas da universidade, porque inseridas no âmbito de sua autonomia. Com efeito, o artigo 2º do decreto diz que constitui o campo funcional da Secretaria de Ensino Superior “a proposição de políticas e diretrizes para o ensino superior em todos os seus níveis”. Como já foi demonstrado, a própria criação da Secretaria de Ensino Superior configura uma inconstitucionalidade, que é agravada pela atribuição àquela Secretaria de funções exclusivas da universidade e que esta tem o direito de exercer com autonomia.
Muitos outros pontos, que significam agressões à autonomia universitária, poderão ser apontados nos infelizes decretos editados pelo Governador do Estado no ano de 2007. Uma referência final deve ser feita a agressões à autonomia financeira da Universidade. Como já foi amplamente demonstrado, a autonomia compreende, necessariamente, a autonomia financeira, que, por sua vez, compreende o direito de receber recursos financeiros do Estado e de lhes dar destinação, pelo modo e no momento que a Universidade, por seus órgãos internos próprios, julgar adequados. Constitui agressão à autonomia da Universidade a sonegação desses recursos que lhe são legalmente assegurados, sendo inadmissível que por conveniência política ou administrativa o governo do Estado retenha esses recursos, mediante o artifício que se convencionou chamar “contingenciamento”, tentando ocultar a realidade da sonegação. A Universidade tem direito constitucional à autonomia e deve posicionar-se firmemente contra todos os artifícios tendentes a diminuição ou negação dessa autonomia.
Nos últimos dias, têm se difundido na grande mídia e no meio acadêmico algumas idéias acerca dos decretos do governo Serra que ocultam o impacto global que os mesmos têm sobre a política educacional do Estado de São Paulo, tanto no que se refere ao conteúdo desses decretos quanto à forma de sua implementação. Visando contribuir com o debate que se instaurou acerca das universidades públicas paulistas, elaboramos um quadro explicativo que sintetiza os cinco principais decretos emitidos pelo governo Serra, apontando algumas de suas conseqüências para o ensino superior no Estado de São Paulo. Vejamos antes algumas das posições que apareceram com maior intensidade no debate sobre os decretos.
O Conselho de Reitores do Estado de São Paulo (CRUESP), presidido pelo Reitor da Unicamp Jorge Tadeu, deliberou recentemente (18 de maio) que os decretos da administração tucana não representam mais uma “ameaça” para a autonomia universitária, uma vez que o Secretário de Ensino Superior, José Aristodemo Pinotti, verbalizou diversas vezes e prometeu deixar intocada tal autonomia. Essa forma adotada pelo CRUESP de minimizar ou resolver os problemas dos decretos parece descurar do que está estabelecido no próprio texto dos decretos. Tal texto confere em linhas gerais "super" poderes ao executivo estadual e traz conseqüências deletérias para o ensino superior paulista.
Outro posicionamento que tem ganhado força é aquele segundo o qual o governo está atrapalhado, daí advindo as ambigüidades do conteúdo dos decretos. Tudo se passa como se uma leitura profunda dos decretos pudesse alterar toda a visão negativa que setores oposicionistas têm dos mesmos. Esta análise parece não atentar para o fato de que as pressões realizadas pelo movimento pela revogação dos decretos têm colocado o governo e seus respectivos secretários numa posição política difícil, o que têm, no nosso entender, gerado contrariedades e ambigüidades nas falas e intervenções dos membros do executivo paulista que recorrentemente têm declarado que estão sendo mal interpretados.
O terceiro posicionamento que tem se destacado nos debates acerca dos decretos é aquele que justifica a eficiência e transparência burocráticas que serão permitidas pela nova gestão educacional. Entende-se assim que a situação administrativa das universidades públicas paulistas pode dar um salto qualitativo se centralizar e concentrar todo o processo decisório no executivo estadual. Tal posicionamento deixa de esclarecer que as instâncias deliberativas das universidades serão esvaziadas e tais instâncias se tornarão órgãos que emitirão sugestões de políticas educacionais que deverão sempre se submeter a uma autorização do governo e dos secretários de Estado.
Toda contribuição para o aperfeiçoamento deste quadro explicativo e o esclarecimento dos decretos será bem-vinda.
Andriei Gutierrez (Doutorando em Ciência Política IFCH/Unicamp) andriei.gutierrez@uol.com.br
Bruno Durães (Doutorando em Ciências Sociais IFCH/Unicamp) bjduraes@gmail.com
Cristiano Ramalho (Doutorando em Ciências Sociais IFCH/Unicamp) cristianownramalho@gmail.com
Danilo Enrico Martuscelli (Doutorando em Ciência Política IFCH/Unicamp) daniloenrico@yahoo.com.br
Decreto n.º 51.460, de 1o. de janeiro de 2007
Descrição Geral:
“Dispõe sobre as alterações de denominação e transferências que especifica, define a organização básica da Administração Direta e suas entidades vinculadas e dá providências correlatas”.
Cf. Art. 4, inc. III: transfere as Universidades Estaduais para a Secretaria de Ensino Superior.
Cf. art. 7, inc. XII: transfere o Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza” – CEETPS – e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP – para a Secretaria de Desenvolvimento
Como era antes:
Os ensinos básico e técnico vinculavam-se à Secretaria de Educação.
O Ensino Superior e a Fapesp eram vinculados à Secretaria de Ciência e Tecnologia
As FATECs eram vinculadas à UNESP
Como ficará:
Ensino Básico: mantém-se na Secretaria de Educação.
Ensino Técnico: vai para a Secretaria de Desenvolvimento (juntamente com a FAPESP). Separa a atividade de pesquisa da atividade de ensino superior.
Ensino Superior: vai para Secretaria de Ensino Superior.
FATECs passam a ser vinculadas a Secretaria de Desenvolvimento
Conseqüências:
· Desacata e fere o princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão previsto no artigo 207 da Constituição Federal (ao fragmentar os ensinos).
· A própria existência de uma Secretaria de Ensino Superior pode ser entendida como uma interferência na autonomia didático-científica das Universidades Estaduais.
Decreto n.º 51.461, de 1º. de janeiro de 2007
Descrição Geral:
“Organiza a Secretaria de Ensino Superior e dá providências correlatas”.
– Cf. art.2, inc. III, letra c: promover a “ampliação das atividades de pesquisa, principalmente as operacionais, objetivando os problemas da realidade nacional”
Cf. art. 42, §1, inc. I: determina que o Secretário de Ensino Superior seja o presidente do Decreto n.º 51.471, de 2 de janeiro de 2007
Descrição Geral:
Dispõe sobre a admissão e a contratação de pessoal na Administração Direta e Indireta e dá providências correlatas”.
Cf. art. 1o e o § 2: Veda a contratação e admissão de pessoal das Universidades Estaduais, entre outros órgãos e autarquias públicos estaduais. Caracteriza novas contratações como “casos excepcionais” restritas à aprovação do Governador do Estado.
Como era antes:
A partir da concessão da Autonomia Universitária para as Universidades Estaduais (em 1989), cada universidade e suas instâncias deliberativas ficavam responsáveis pela administração e aplicação dos recursos financeiros e orçamentários a elas destinados por determinação legal (por meio do repasse de no mínimo 9,57% do ICMS).
Como ficará:
Novas contratações são vedadas e restringidas aos casos excepcionais a serem aprovados pelo Governador do Estado depois de submetidos ao “Comitê de Qualidade da Gestão Pública” (entidade composta por diversos Secretários do Estado e presidida pelo Chefe da Casa Civil).
Conseqüências:
Desloca os poderes decisórios fundamentais das administrações e instâncias deliberativas das Universidades Públicas Paulistas – no que diz respeito à contratação e admissão de pessoal – para concentrá-los no executivo estadual. Fere completamente a autonomia administrativa universitária, neste âmbito, garantida pelo artigo 207 da Constituição Federal do Brasil e em específico a Autonomia Universitária das Estaduais de 1989.
promove o enxugamento do quadro universitário. Isto pode implicar: precarização das atividades fundamentais da universidade, podendo resultar numa maior privatização das mesmas; e precarização do trabalho docente, administrativo e de pesquisa.
Decreto n.º 51.636, de 9 de março de 2007
Descrição Geral:
“Fixa normas para a execução orçamentária e financeira do exercício de 2007 e dá providências correlatas”.
Cf. art. 2, inc. III: cria o Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios – SIAFEM/SP, obrigando todas as unidades administrativas e autarquias do Estado, especialmente as Universidades Estaduais, a submeterem-se ao mesmo.
Cf. Arts. 6 e 7: delimita todos os gastos públicos estaduais à “Programação Orçamentária da Despesa do Estado” e obriga as “Unidades Gestora Executoras”, no caso as universidades e autarquias, a submeterem suas possíveis alterações orçamentárias na forma de “solicitação” por meio de sistema eletrônico.
Como era antes:
Idem do decreto acima. Desde 1989, as unidades administrativas e as instâncias deliberativas das Universidades Estaduais Paulistas gozavam de autonomia de gestão financeira e orçamentária.
Como ficará:
Obriga as Universidades Estaduais Paulistas a ingressarem no SIAFEM/SP, por meio da sua vinculação à “Programação Orçamentária de Despesas do Estado”. Submete a autonomia de remanejamento orçamentário das Universidades à posterior autorização do Executivo Estadual por meio do SIAFEM.
Conseqüências:
Engessa e subordina a gestão orçamentária e financeira das Universidades Estaduais ao Executivo Estadual, por intermédio do SIAFEM/SP.
Fere a prerrogativa constitucional da Autonomia Universitária garantida pelo artigo 207 da Constituição Federal.
Decreto n.º 51.660, de 14 de março de 2007
Descrição Geral:“Institui a Comissão de Política Salarial e dá providências correlatas”.
Cf. art. 1o: vincula diretamente a Comissão de Política Salarial ao Governador do Estado.
Cf. o art. 7: vincula “as reivindicações salariais, e a instituição ou revisão de vantagens e benefícios de qualquer natureza” aos critérios da Comissão de Política Salarial, mediadas pela Secretaria de Gestão Pública.
Cf. art. 8: submete as negociações salariais dos servidores públicos diretamente à Secretaria de Gestão Pública.
Como era antes:
As questões relativas à política salarial eram negociadas e deliberadas no âmbito do Secretaria de Gestão Pública.
Conseqüências:
Concentração de toda negociação referente às políticas salariais ao âmbito do Executivo Estadual
Submete todas as reivindicações, instituições ou revisões de vantagens e benefícios à submissão da Secretaria de Gestão Pública, que segue as diretrizes da Comissão de Política Salarial e que, por sua vez, está subordinada ao Executivo Estadual.
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Veja também
Enquanto isso, na seção de cartas da Folha de São Paulo…
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2505200710.htm
"Excelente o artigo assinado pelos estudantes da USP ("Da ocupação ao debate: a educação em xeque", "Tendências/Debates", 25/5), diferentemente dos artigos que temos lido nesta Folha de intelectuais e autoridades do ensino superior paulista.
Demonstra a correção das ações, a justeza das reivindicações e a clareza do debate suscitado pelos alunos e desrespeitado pelas autoridades, principalmente por uma mídia facciosa.
Parabéns a esta Folha por oferecer seu espaço para a exibição das idéias, palavras, sentimentos e razões que movem os estudantes da USP."
THIAGO C. P. SILVA (São Paulo, SP)
"Sou estudante da Faculdade de Direito da USP e venho aqui mostrar minha enorme indignação em relação à maneira como a Folha tem passado à opinião pública a imagem das mobilizações dos estudantes, funcionários e professores da USP.
Parece que o jornal não faz nenhum esforço para mostrar o que realmente está acontecendo. Não estamos em greve porque "não queremos prestar contas" ao Siafem diariamente. Num total de 72 folhas de decretos, salientar essa parte é apenas querer colocar os contribuintes contra os alunos.
Ao destacar que os reitores publicaram uma nota em que dizem que a autonomia universitária não vai ser afetada com os decretos, a Folha se esquece de dizer que esses reitores foram nomeados diretamente pelo governo do Estado, há mais de 12 anos governado pelo PSDB."
VIVIAN LEGNAME BARBOUR (São Paulo, SP)
Direto do Conversa Afiada em 25/05/07
Desde Setembro, não se sabe o que o Governo de São Paulo faz com relação às verbas das universidades. É possível, portanto, que o Governador Serra já esteja fazendo em 2007 aquilo que o Secretário de Ensino Superior, José Aristodemo Pinotti, disse que só aconteceria em 2008: manipular as verbas das universidades segundo o arbítrio do Governador.
Essa é a tese do deputado Mário Reali, do PT, membro da Comissão de Finanças e Orçamentos da Assembléia Legislativa de São Paulo, que falou em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta sexta-feira, dia 25 (clique aqui para ouvir o áudio).
“Isso é possível. O controle dos repasses, na verdade, nós não sabemos os valores que estão sendo repassados e as garantias do cumprimento dos 9,57% (que é o valor do ICMS que o Governo tem que repassar às universidades)”, disse Reali.
Segundo Reali, hoje os deputados e a sociedade não têm informação para dizer o que está acontecendo em relação aos repasses de verbas às universidades.
Leia a íntegra da entrevista do deputado Mário Reali:
Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com o deputado Mário Reali, do PT e da Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Deputado Reali, o senhor vai bem?
Mário Reali – Tudo bem, Paulo.
Paulo Henrique Amorim – É um prazer falar com o senhor, deputado. Deputado, O José Ernesto Credendio, da “Folha de São Paulo” publica na edição on-line, que eu acabo de ler, que o governo José Serra pretende fazer uma mudança no sistema de orçamento do Estado de São Paulo de tal maneira que o Diário Oficial do Estado não divulgue o movimento das contas das universidades estaduais. O que significa exatamente isso para um contribuinte, um eleitor em São Paulo que não saiba como funciona essa Lei de Diretrizes Orçamentárias?
Mário Reali – Bom, primeiro, o problema não é só a divulgação no Diário Oficial. Mas mesmo no site da Secretaria da Fazenda, ou seja, permitir o acompanhamento do cidadão paulista de como está a execução orçamentária, de como estão sendo gastos os recursos orçamentários do Estado. O governador tem falado em relação à universidade que é preciso ter transparência. Então, por isso, inclusive, a proposta de colocar a execução orçamentária da universidade no acompanhamento financeiro do Estado. Agora, a bancada do PT tem feito anualmente emendas à LDO para garantir os repasses do governo do Estado às universidades seja explicitado, de maneira clara. Porque o orçamento é uma peça muito complexa paro seu acompanhamento do processo.
Paulo Henrique Amorim – Evidentemente.
Mário Reali – No governo Lembo, por exemplo, nós conseguimos que se a emenda fosse aprovada na LDO e tivemos o acompanhamento e a explicitação dessa transferência no Tesouro para a universidade, sendo explicitada no site da Secretariada da Fazenda, no site das universidades. Nós notamos, por exemplo, no site da Secretariada da Fazenda até setembro do ano passado havia essa transparência. Em setembro, talvez por influencia da nova, do governo que estaria por vir, saiu do ar. O da Unesp agora, a partir de março, já não estamos tendo acesso de quanto o governo está repassando para a universidade. E na LDO, não havendo essa previsão, obviamente nós vamos fazer a proposta de emenda pra garantir a transparência como também…
Paulo Henrique Amorim – Pois não.
Mário Reali – Como também os relatórios quadrimestrais, que são obrigação da Lei de Responsabilidade Fiscal, nós sempre cobramos que as transferências, as verbas vinculas – Educação, Saúde – pra garantir os percentuais deveriam ser apresentadas. E o Estado sempre diz que não: “Isso só no balanço no final do ano, porque a execução orçamentária é muito heterogênea, não tem regularidade”.
Paulo Henrique Amorim – Se eu entendo bem o que está acontecendo, me permita uma linguagem leiga: ele, para justificar a administração centralizada na mão dele das contas das universidades, ele invoca a transparência. E no que concerne a mostrar o que ele faz, ele faz, digamos, um apagão.
Mário Reali – É, exatamente isso. A transparência é boa para aquilo que ele precisa ter controle. Agora, pra gente controlá-lo ele prefere não ter transparência.
Paulo Henrique Amorim – Então, ele pra controlar ele quer luz acesa. Pra nós controlarmos ele, ele apaga a luz.
Mário Reali – Exatamente. Esse é o princípio.
Paulo Henrique Amorim – Entendi. E o que o senhor acha que consegue fazer com a sua bancada minoritária?
Mário Reali – Então, nós vamos pressionar na formação da LDO pra que esses instrumentos de controle sejam controlados. Porque, aparentemente, é uma questão burocrática, a apresentação de demonstrativos, peguei o manual do Tesouro Nacional que inclusive foi elaborado durante o governo Fernando Henrique, a elaboração dos relatórios, da prestação de contas da Lei de Responsabilidade Fiscal e tal. Mas eles são fundamentais para garantir a transparência da execução orçamentária e o acompanhamento do cidadão. Hoje nós temos muitas dificuldades. Se você pegar, por exemplo, as empresas estatais que na verdade nós não temos o controle a não ser através de balanços, desde CDHU, Metrô, as diversas empresas, a CPTM, EMTU, nós só temos acesso através dos balanços, porque são empresas não dependentes do Estado. Mas, por outro lado, você pegando o balanço vai ver que se elas fossem realmente não dependentes elas não precisariam do aporte de recursos que o governo coloca…
Paulo Henrique Amorim – Também aí tem um apagão.
Mário Reali – Aí também tem um apagão. O CDHU que é objeto de um pedido de CPI exatamente por isso, nós temos uma dificuldade muito grande de acompanhar a execução orçamentária, de conhecer os contratos que estão sendo conduzidos pelo CDHU e inclusive os contratos que são apontados pelo Tribunal de Contas que foram enviado à Assembléia para avaliação, muito deles estavam engavetados. Em 2006 nós apontamos essa questão, eram 970 contratos que não haviam sido deliberados na Comissão de Finanças. E agora esses contratos nós conseguimos colocar na pauta e produzir uma série de decretos legislativos para que eles fossem deliberados e enviados ao Ministério Público para investigação. E o que aconteceu é que até hoje esses decretos legislativos, esses projetos de decretos legislativos não foram votados pelo plenário. E fazem parte da pauta obstruída e não estão sendo objetos de investigação do Ministério Público.
Paulo Henrique Amorim – Agora, deputado, só pra concluir e entender o seu raciocínio: quer dizer que desde setembro não se sabe o que o governo de São Paulo faz com relação às verbas das universidades.
Mário Reali – Exatamente.
Paulo Henrique Amorim – É possível então que o governador Serra já esteja fazendo em 2007 aquilo que o secretário Pinotti disse que só aconteceria em 2008, ou seja, manipular as verbas das universidades segundo o arbítrio do governador. Isso é possível ou não?
Mário Reali – Isso é possível. O controle dos repasses, nós, na verdade, não sabemos os valores que estão sendo repassados e a garantia do cumprimento dos 9,57%.
Paulo Henrique Amorim – Ou seja, isso pode estar sendo feito já hoje.
Mário Reali – Isso pode estar sendo hoje. Hoje nós não temos informação pra dizer realmente o que está acontecendo em relação a esse caso.
Paulo Henrique Amorim – Muito bem, deputado Mário Reali. Nós acompanharemos essa momentosa questão e esperamos contar com a sua colaboração daqui pra frente.
Mário Reali – Pois não. Muito obrigado. É um prazer trazer informações e está discutindo com você.
Paulo Henrique Amorim – Muito obrigado, deputado. Um abraço.
Mário Reali – Um abraço.
Clique aqui para ler a reportagem da Folha Online que fala da limitação da divulgação de repasses às universidades.
Adriana Dias, Mestranda em Antropologia Social, UNICAMP
A presente reflexão tenta se centrar na relação entre estudantes, imprensa e Estado. Os estudantes da USP (mas, o movimento amplia-se para todas as Universidades Públicas Paulistas), a imprensa é a grande mídia (em especial a conduzida pela Globo, pela Folha de São Paulo, pelo Estado e pela Veja – nesta em especial o blog do colunista Reinaldo Azevedo[1]) e o Estado é o paulista, neste início de “gestão” do governador José Serra. Não pretendo dar conta da relação, nem esgotar o assunto, mas gostaria de problematizar como os estudantes são tratados pela grande mídia, pelo governo, em suas comunicações a esta mesma mídia. A situação está a tal ponto absurda, que no Observatório de Imprensa, o jornalista, pós-graduado em Ciências Sociais, pela USP, Luiz Weis comentou: “Dá vontade de ocupar as redações da Folha e do Estado em protesto contra a lastimável cobertura da crise aberta nas universidades públicas paulistas, em especial na USP, pelo decreto do governador José Serra de 1º de janeiro, que "organiza a secretaria de Ensino Superior e dá providências correlatas[2]”… Esta observação revela como o evento da ocupação da USP por estudantes, em 3 de maio último, divide a imprensa: há a grande mídia, que deseja intervenção policial na USP, contra os “vândalos”, “mentirosos”, “vagabundos”, “remelentos”, para citar apenas algumas das formas como a imprensa se dirige a estudantes, que, diga-se de passagem, conquistaram o “status” de estudantes da USP, por meio de um processo vestibular que se encontra entre os mais difíceis do país, há uma outra mídia que reclama o direito à desocupação pacífica pautada ela negociação e pelo diálogo com a reitora, nunca com os policiais.
O governador José Serra, ainda que nas últimas horas tenha se pronunciado “a favor da desocupação pacífica”, talvez diante da enxurrada de críticas que recebeu desde que o estopim da ocupação da Reitoria pelos alunos explodiu seu ideal de governo exemplo-perfeito-garantidor-de-eleição-presidencial, a primeira postura de José Serra foi a de criticar duramente os alunos, atribuindo seu ato ao "desejo de agitar" e baseado em "mentiras". A este comentário acrescentou o seguinte, legitimando-o por ter sido presidente da UNE: “Fazíamos agitação. Estávamos baseados em posições políticas, em teses que podiam ser discutíveis, mas eram verdadeiras. Não estavam baseadas em miragens e mentiras”.
A Folha de São Paulo adota a postura de encarar a ocupação como “uma invasão”, e dispara no sensacionalismo das fotos, mostrando helicópteros da Polícia Militar sobre o prédio da reitoria”, fotos do comandante da operação, com sugestões de como os jovens devem se proteger de um provável confronto: “é preciso evitar óculos e lentes de contato”. Na verdade, é a própria folha que parece evitar “óculos e lentes de contato” no seu confronto com a verdade: várias vezes avisou que o patrimônio havia sido destruído ou documentos teriam sido extraviados, para ser desmentida por fotos e testemunhos postados pela Internet afora. Nasce uma nova arena de debate, e a possibilidade de ver fotos e filmes, disponibilizados pelos estudantes, parece ter esvaziado, pelo menos um pouco, a possibilidade de “se inventar qualquer coisa pelo discurso”, como um jovem postou num comentário.
A ocupação da reitoria, ato a que eu credito a condição de legítimo, de pacífico, de preservador, da Universidade Pública e dos direitos constitucionais garantidos, se instala como uma resposta a um Executivo que insiste em governar por decretos, e enquanto o faz, precariza as condições educacionais, se recusando ao debate e ao diálogo. Diálogo e debate amplamente aberto aos estudantes, que exibem na Internet sua pauta de reivindicações, as críticas que recebem, as monções de apoio que lhe são dadas.
Fala-se, nos portais que se afinam com a fala do governador, que as Universidades públicas são elitizadas, ignorando o grande número de alunos pobres que nelas entram, vencendo a lógica de exclusão do ensino público fundamental e médio, fala-se que eles são “um povo apartado da realidade”. Pede-se por um grande líder, que use da força e os faça calar. Diz Hannah Arendt: “o povo, em todas as grandes revoluções, luta por um sistema realmente representativo, a ralé brada sempre pelo «homem forte», pelo «grande chefe».[…]”. Esta imprensa não é a voz do povo. É a voz da ralé. Os estudantes lutam pelo povo, querem ampliar o debate acerca da educação pública de qualidade para evitar que, no estado de São Paulo, a universalização do ensino superior se mescle com a depredação absoluta, como aconteceu ao ensino médio e ao fundamental durante todos estes anos de governo “desenvolvimentista”. E de quem seria culpa desta perda de qualidade? Dos nordestinos, como afirmou José Serra, ainda candidato? Claro que não: a culpa é dos que evitam “óculos e lentes de contato” para evitar ver o compromisso necessário: educação de qualidade se faz com verbas, com política públicas de valorização do professor, com incentivo à politização dos alunos, para que como estes, da USP se mobilizem, por si, pelo futuro, respeitando a aliança insolúvel, garantida constitucionalmente entre pesquisa, ensino e extensão, que os decretos visam fragmentar.
Este é um movimento popular, o vídeo do dia das mães, disponibilizado pelos alunos em seu blog[3], é uma amostra de como esses alunos souberam preservar o sentido de povo. Usar de força policial é totalitário: eles questionam um ato administrativo, apontam, junto com juristas, jornalistas, sociólogos, antropólogos, filósofos, cientistas políticos, artistas, e outros intelectuais de várias áreas, para o avanço sobre a autonomia das Universidades Paulistas. Governador, miragem é achar que vai se resolver isso com força, mentira é negar a verdade e a força de sua luta política.
Paulo Henrique Amorim
. O jeito Serra de governar é o jeito Putin de governar.
. Vladimir Putin, o grande democrata de todas as Rússias, como um bom quadro KGB, governa assim: na calada da noite e com a imprensa de joelhos.
. Foi o que Serra fez com a verba das universidades estaduais.
. Com a entrevista que fiz com o deputado Mario Reali, do PT de São Paulo, a cronologia foi a seguinte.
. Desde o ano passado, em combinação com o Governador Cláudio Lembo, Serra “apagou” os números das verbas das universidades do Diário Oficial e de todos os sites governamentais (clique aqui para ler a entrevista com Mario Reali).
. Ao tomar posse, na condição de presidente eleito, Serra anunciou que ia fazer uma faxina na administração de Geraldo Alckmin e de Cláudio Lembo. E disse isso na frente dos dois.
. O que Serra fez, na verdade, foi suspender todos os desembolsos e centralizar tudo na mão dele.
. Inclusive as verbas das universidades.
(A Constituição do Estado determina que 9,57% da arrecadação do ICMS sejam destinados às três universidades estaduais.)
. Ao mesmo tempo, Serra transformou o novo secretário de ensino superior em ditador do Conselho de Reitores.
. A mídia conservadora (e golpista) ficou de bico calado.
. E Putin começou a governar tranqüilo.
(Sobre a cratera do Metrô em que morreram sete pessoas, o presidente eleito ainda não se manifestou.)
. Aí surgiu o que Putin não esperava: a greve dos estudantes.
. A mídia conservadora (e golpista) continuava de bico calado.
. A greve continuava.
. Putin fez a primeira concessão: o Secretário de Ensino Superior deixa de ser o ditador do Conselho de Reitores.
. A greve continuou e se espalhou. E a mídia conservadora (e golpista) não podia mais ignorá-la.
. Putin fez a segunda concessão: o Secretário da Fazenda prometeu que as verbas seriam administradas em clima de “entendimento”.
. Os reitores se deixaram enganar.
. A greve continuou e se espalhou.
. Só nesta sexta-feira Serra falou sobre a greve: disse que a greve é política.
. O que é o mesmo que dizer que a Terra gira em torno do Sol.
. Toda greve é política, como bem sabe o camarada Putin.
. A greve continua. Serra será capaz de fazer o terceiro recuo: oferecer aos reitores a ilusão de que recuperaram a autonomia.
. Porque ele, o presidente eleito, continuará a manobrar as verbas como bem entender, com o controle do Diário Oficial, dos sites do Governo e da mídia conservadora (e golpista).
. Em resumo, ele vai ceder em tudo.
. E vai continuar a controlar as verbas e ninguém será capaz de saber o que ele faz com elas.
. Nem Putin seria capaz dessa obra-prima.
"Universidade não pode ser utilitária"
Diretor científico da Fapesp diz que papel da academia não é resolver problemas sociais nem gerar inovação tecnológica
Órgão estadual de fomento à pesquisa de SP prepara o lançamento de programas de estudos de mudanças do clima e álcool combustível
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
Inovação tecnológica deve ser feita pelas empresas. A solução dos problemas do Brasil, como a pobreza, é coisa para o Estado resolver. E a universidade precisa manter distância segura de ambas as demandas. Para o engenheiro eletrônico Carlos Henrique de Brito Cruz, atual diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), a universidade precisa recuperar suas antigas convicções e cumprir a sua missão básica: formar recursos humanos.
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