OSWALDO BAPTISTA DUARTE FILHO
Em relação à autonomia universitária, algumas flores certamente já foram arrancadas. Mas ainda temos nossa voz |
DATAM DE no mínimo 20 anos atrás as lutas no Brasil pela concretização da autonomia universitária.
A
Constituição brasileira institui, no artigo 207, que as universidades
gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial. Sucessivos governos têm afirmado a
necessidade de regulamentação desse artigo e, nessa espera, o que tem
acontecido de fato é a redução da pouca autonomia da qual um dia talvez
tenhamos gozado.
A autonomia é prerrogativa intrínseca à
instituição universitária em qualquer lugar do mundo, assim como um
instrumento fundamental de gestão, sem o qual as universidades correm o
risco de se tornar inviáveis.
As universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e
Unicamp) são referência no Brasil quando se trata de autonomia. Desde
1989, elas conquistaram uma experiência de gestão autônoma que baliza,
inclusive, todo o sistema federal de ensino superior nos debates sobre
o tema.
No
entanto, embora tenha trazido resultados importantes, nem mesmo a
autonomia dessas instituições está garantida, uma vez que depende de
decretos e, portanto, do jugo de diferentes governantes.
No
contexto das instituições federais de ensino superior (Ifes), a
autonomia é ainda mais urgente e complexa. Essas instituições compõem
um sistema com papel estruturante na integração e desenvolvimento do
país, por meio, principalmente, da formação de profissionais altamente
qualificados e da produção de conhecimento científico socialmente
relevante e com altíssima qualidade acadêmica. Tais atividades têm
acontecido apesar do convívio das Ifes, em passado recente, com a
redução de seus recursos humanos e financeiros.
Essa atuação se dá também em um
cenário de regressão da autonomia. Se nunca tivemos autonomia de fato,
ao longo dos anos fomos perdendo as poucas ferramentas eficazes de
gestão das quais um dia gozamos.
Até 1995, as Ifes dispunham de
alguma flexibilidade na contratação de recursos humanos, podendo repor
automaticamente vagas liberadas por demissão, aposentadoria ou morte de
servidores. Desde então, isso não é mais possível. A inclusão das Ifes
no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo
Federal), em 1988, representou um dos principais obstáculos ao
exercício de uma administração autônoma.
Atualmente, essas
instituições precisam pedir autorização ao governo federal para o
cumprimento de suas obrigações mais elementares, como o pagamento de
suas contas de água e energia elétrica. Além disso, não podem fazer
nenhuma alteração nas rubricas às quais o recurso é destinado.
A
autonomia que defendemos certamente é marcada por transparência e
responsabilidade, o que significa não questionar o dever de prestarmos
contas de nossas ações -autonomia não é sinônimo de soberania.
No
entanto, essa transparência não deve estar identificada com o controle
burocrático e deletério do dia-a-dia das Ifes, e sim com políticas mais
abrangentes para o ensino superior público brasileiro.
Embora
existentes, as iniciativas atuais do governo federal nesse sentido
ainda são extremamente tímidas. Tem sido árdua a reconquista da pouca
autonomia que um dia tivemos.
A Andifes (Associação Nacional dos
Dirigentes das Ifes) vem propondo, ao longo desses anos, uma série de
projetos que viabilizariam a autonomia, por meio da Lei Orgânica das
Universidades Públicas Federais e de outras medidas aparentemente
simples, como a remoção dos incontáveis decretos, normas e portarias
que, na prática, aniquilam qualquer possibilidade de gestão autônoma.
Entretanto, o que vemos foi, por exemplo,
a retirada na versão final do projeto de reforma universitária de todos os pontos sugeridos pelas Ifes em relação à autonomia.
O
poeta brasileiro Eduardo Alves da Costa alerta: "Primeiro, eles vêm à
noite, com passo furtivo, arrancam uma flor e não dizemos nada. (…)
Até que um dia o mais débil dentre eles entra sozinho em nossa casa,
rouba nossa luz, arranca a voz de nossa garganta e já não podemos dizer
nada".
Em relação à autonomia universitária, algumas flores
certamente já foram arrancadas. Mas ainda temos nossa voz, e com ela é
urgente que toda a comunidade universitária levante a bandeira da
autonomia. Com responsabilidade e zelo pelo patrimônio público, é
preciso garantir a continuidade e a expansão do ensino superior
público, gratuito e de qualidade em nosso país. Há ainda muito por
dizer, e mais ainda por fazer.
OSWALDO
BAPTISTA DUARTE FILHO é reitor da UFSCar (Universidade Federal de São
Carlos) e presidente da e atual presidente da comissão de autonomia da
Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais
de Ensino Superior). Foi presidente da Andifes
Manifestação de Docentes do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da EESC USP
(Este documento foi redigido antes da desocupação da Reitoria da USP e do Edifício E1)
Nós, abaixo assinados, docentes do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos – USP, assim como o conjunto da universidade e boa parte da opinião pública, vimos acompanhando com preocupação a grave situação das Universidades Estaduais Paulistas e da USP em particular.
Consideramos nossa responsabilidade apelar aos estudantes, aos servidores não docentes e às autoridades universitárias pela imediata interrupção da espiral de recrudescimento da crise interna, mediante a desocupação pacífica da Reitoria, do Edifício E1 e do bloco C do Campus de São Carlos, a suspensão de toda e qualquer medida de coerção ou restrição aos direitos constitucionais dos membros da Universidade e pela concomitante abertura de negociações pautadas pela tolerância e pelo respeito à pluralidade interna e à legitimidade das representações, sindicais e institucionais.
A desastrada intervenção do Governo Serra, na tentativa de reorganizar o sistema de ensino superior e ingerir em âmbitos administrativos resguardados pelo instituto da autonomia universitária, gerou controvérsias, justificada preocupação de muitos, indiferença de outros tantos e, sobretudo, revelou o grave esgarçamento das relações entre setores e segmentos da Universidade e os estreitos limites da tolerância e do diálogo praticados no interior da Universidade.
A eclosão dessa crise não foi um raio em céu azul. Ela é resultado sim da reconhecida vocação centralizadora e da evidente inabilidade ou arrogância do Governo Serra. Afinal, qual o sentido e o significado político de demitir a reitora da USP da presidência do CRUESP pela imprensa? E de voltar atrás 26 dias depois?
Mas essa faísca veio encontrar um terreno preparado ao longo dos anos. Pela introjeção dos paradigmas produtivistas e competitivos na produção de pesquisa e conseqüente minimização da importância do ensino; pelo progressivo afastamento entre os segmentos universitários e suas representações sindicais, pela evidente limitação institucional da expressão e efetiva participação de estudantes e servidores não docentes no processo decisório da Universidade. E mais recentemente, pelas conseqüências de uma expansão não planejada do ensino de graduação.
Esta crise evidenciou também, para a Universidade e para a opinião pública, a incapacidade das lideranças institucionais e sindicais de estabelecer um processo democrático e tolerante de interlocução e negociação.
É inquestionável que a significativa – e necessária – expansão de vagas na graduação não foi acompanhada pela adequada provisão de docentes e servidores, por um correto planejamento das instalações necessárias ou pela garantia de recursos orçamentários compatíveis.
Sobretudo, no que diz respeito a um dos motes imediatos desta crise, não foi acompanhada pela correspondente ampliação dos recursos e instrumentos de apoio à permanência dos estudantes com comprovada situação de carência sócio-econômica, colocando assim em xeque a política de inclusão social pela via de expansão de matrículas na graduação, proposta pela atual administração.
Se a eclosão da crise pode ser compreendida, isso não significa aceitação de seus encaminhamentos. Reafirmamos nossas manifestações anteriores no sentido de que a legitimidade de reivindicações não pode justificar ameaças ou danos ao patrimônio público, coerção física ou moral e qualquer cerceamento aos direitos constitucionais dos membros da Universidade, aí incluído o direito de acesso ao local de trabalho.
A ocupação da Reitoria e o agravamento da crise interna tiveram o condão de pautar socialmente o tema da autonomia universitária e do significado estratégico do sistema de fomento à pesquisa e das Universidades paulistas para o desenvolvimento científico cultural e tecnológico de nosso Estado e do país.
Foi certamente a percepção de uma clara mudança da opinião pública nesse sentido que levou o Governo Serra à edição do “decreto declaratório” de 30/05/07 que, sem eliminar todas as apreensões dos segmentos universitários, significou uma expressiva vitória do movimento de estudantes, funcionários e docentes e deve, a nosso juízo, ser reconhecida como tal. Seu caráter parcial só pode surpreender ou servir de argumento àqueles que acreditam que o exercício democrático da política comporte vitórias totais.
Em documento anterior à publicação desse decreto, os docentes do Campus, reunidos em Assembléia, já alertavam que a eventual alteração dos decretos não significaria o fim das ameaças à autonomia universitária ou ao caráter público e gratuito do ensino.
Assim, a reconstrução das condições de diálogo institucional, o exercício continuado do respeito e da negociação entre os segmentos universitários, o repúdio claro a toda forma de intolerância, violência ou coerção constituem a condição imprescindível e o pressuposto fundamental da luta cotidiana em defesa da Universidade Pública, Gratuita, Autônoma e de Excelência.
Luta que se expressa no claro posicionamento contra as ilusões da torre de marfim; contra as tentativas de ingerência da burocracia estatal na vida universitária; contra os movimentos e tendências privatizantes no exterior e no interior das Universidades e contra a inércia, administrativa ou corporativa, que resiste à ampliação da transparência interna e externa.
É preciso garantir a plena liberdade do ensino e da pesquisa e reconhecer que isto não é incompatível com a necessidade de construir mecanismos adequados de controle social da Universidade, distinguindo claramente o repúdio à ingerência estatal e o reconhecimento de que a Universidade deve servir e prestar contas à sociedade que a mantém.
É esta compreensão do papel de nossas Universidades e da natureza da crise hoje vivida que nos leva a manifestar nossa disposição de continuar a exercitar o respeito à divergência e a defesa da liberdade de expressão e manifestação como condições essenciais para a convivência social democrática e para a construção de uma sociedade brasileira tecnológica e culturalmente soberana e socialmente mais justa.
Assim, reafirmamos nosso apelo a estudantes, servidores e autoridades universitárias pela superação pacífica e democrática do atual impasse.
Temos o direito e o dever, como docentes e cidadãos, de reivindicar o imediato restabelecimento das condições de funcionamento pleno da Universidade, a cessação das ocupações da Reitoria da USP, do Edifício E1 e do Bloco C do Campus de São Carlos, o fim de qualquer restrição à livre circulação dos membros da comunidade universitária.
Temos o direito e o dever, como docentes e cidadãos, de apelar às autoridades universitárias pela inequívoca garantia do cumprimento pleno dos compromissos já assumidos, de não punição decorrente do exercício da greve como legítimo recurso de reivindicação, de estabelecimento de uma pauta positiva para discussão didático-pedagógica dos dias paralisados e da imediata retomada das negociações sobre todos os temas ainda em aberto.
Apelamos, por fim, às instâncias de direção colegiada da Universidade, em todos os níveis, para que possamos extrair desta crise um saldo de crescimento, abrindo espaços institucionais para o debate, sério e consistente, das questões e problemas, conceituais, pedagógicos, políticos e administrativos, que a crise explicitou.
São Carlos, 21 de junho de 2007
Akemi Ino; Anja Pratschke; Carlos A. Ferreira Martins; Carlos R. Monteiro de Andrade; Cibele Saliba Rizek; David Moreno Sperling; Eduvaldo P. Sichieri; Eulalia Portela Negrelos; Fábio L. Souza Santos; Francisco Sales Trajano Filho; Gelson de Almeida Pinto; Givaldo Luiz Medeiros; Javier Mazariegos Pablos; João Adriano Rossignolo; João Marcos A. Lopes; Joubert José Lancha; Luciana B. Martins Schenk; Luis Espallargas Gimenez; Luis A. Recaman Barros; Manoel A. L. Rodrigues Alves; Marcelo Cláudio Tramontano; Marcelo Suzuki; Marcio Minto Fabrício; Miguel Antonio Buzzar; Osny Pellegrino Ferreira; Paulo César Castral; Paulo Y. Fujioka; Renato L. Sobral Anelli; Rui Sardinha Lopes; Sarah Feldman; Telma de Barros Corrêa.
Pois é Barba!! O estranho é que mesmo sabendo que está sendo proposto um projeto de reforma universitária que ignora completamente as reivindicações históricas do movimento estudantil e as reivindicações de autonomia dos reitores, e que, pelo contrario, vem possibilitar cada vez mais que as decisões em nossa universidade sejam tomadas de acordo com o interesse de empresas privadas que nela entram para direcionar toda a pesquisa, um projeto que propõe que as decisões de nossa universidade sejam tomadas num conselho da “sociedade civil” que nada mais é do que uma forma de garantir que os tubarões do ensino e outra empresas tomem decisões sobre nossa universidade sucateando-a, mesmo com tudo isso, você se recusa a se posicionar ao lado dos estudantes pela retirada deste projeto de reforma universitária (PL 7200) de tramitação do congresso.
Dentro deste contexto é no mínimo hilário seu texto. E fica mais estonteante a cada vez que pensamos que os propositores de tal projeto de lei fazem parte do seu grupo político dentro do partido dos trabalhadores.
Os estudantes não são bobos caro Barba, nós temos clareza sobre quem são os que lutam do nosso lado por melhor que seja sua fantasia de ovelha.
Pois é Barba!! O estranho é que mesmo sabendo que está sendo proposto um projeto de reforma universitária que ignora completamente as reivindicações históricas do movimento estudantil e as reivindicações de autonomia dos reitores, e que, pelo contrario, vem possibilitar cada vez mais que as decisões em nossa universidade sejam tomadas de acordo com o interesse de empresas privadas que nela entram para direcionar toda a pesquisa, um projeto que propõe que as decisões de nossa universidade sejam tomadas num conselho da “sociedade civil” que nada mais é do que uma forma de garantir que os tubarões do ensino e outra empresas tomem decisões sobre nossa universidade sucateando-a, mesmo com tudo isso, você se recusa a se posicionar ao lado dos estudantes pela retirada deste projeto de reforma universitária (PL 7200) de tramitação do congresso.
Dentro deste contexto é no mínimo hilário seu texto. E fica mais estonteante a cada vez que pensamos que os propositores de tal projeto de lei fazem parte do seu grupo político dentro do partido dos trabalhadores.
Os estudantes não são bobos caro Barba, nós temos clareza sobre quem são os que lutam do nosso lado por melhor que seja sua fantasia de ovelha.
Que legal que você manifesta seu apoio indireto à luta contra os decretos! Agora só falta divulgar publicamente esse apoio na UFSCar e entrar na luta pela retirada da mais recente Reforma Universitária…
Ah e talvez também seria legal reabrir a discussão, dessa vez PARA O CAMPUS (Conselho Universitário não vale), a respeito da destruição de pedaços do cerrado da UFSCar para a implantação de prédios da PETROBRAS e expansão do campus. Como não existe quase mais nada de cerrado no mundo, acho que uma discussão mais ampla seria essencial, lembrando que o cerrado é patrimônio do município e da Humanidade, tombado pela UNESCO nas reservas das Emas e da Chapada dos Veadeiros.